A Havana da minha imaginação
era a do “Trilogia Suja de Havana”,
livro do Pedro Juan Gutierrez, com o malecon como palco principal e seus edifícios em ruínas.
A fome da década de 90
certamente tinha passado, mas a cidade provavelmente continuaria a mesma....
Muitas coisas lidas em blogs
e sites também mexiam na minha imaginação, mas ao chegar na cidade, já a partir
do desembarque no aeroporto José Martí, fui começando a desconstruir o que
estava pré concebido.
Poster em uma livraria |
Salão de desembarque lotado
de turistas, imigração rápida, sem filas. Não sei se dei sorte.
O motorista do taxi
contratado pela casa particular onde iríamos ficar estava nos esperando com uma
plaquinha com nossos nomes e o carro não
era nenhuma antiguidade e sim um novíssimo.... (marca francesa que não lembro...).
Procurei, mas não vi o tal do cartaz da Revolução que dizem ficar perto do
aeroporto. Tá certo. Depois eu os veria pela cidade.
Chegando na casa contratada,
em Centro Habana, os proprietários
não se encontravam e fomos recebidos pela mãe da dona, que conseguiu entender um
pouco meu portunhol e me indicou o caminho da Calle Obispo, talvez a mais movimentada rua de Havana, onde
encontraríamos uma casa de câmbio.
E lá saio eu, caminhando em
direção a Havana Vieja, olhando pra tudo e pra todos, com uma curiosidade
sedenta como nunca tinha tido em nenhuma viagem.
A decadência descrita em Trilogia
continua ali, com muitos prédios em péssimas condições, alguns com aparência de
cortiços, mas ao alcançar a zona mais turística da cidade, a quantidade de
turistas circulando me impressionou. Na rua Obispo, somente para pedestre, o
burburinho de lojinhas, restaurantes, pessoas das mais diferentes nacionalidade
foi surpresa total. Estou em Cuba mesmo?
Estátua viva na rua Obispo |
A primeira afirmativa pra
minha pergunta veio com a fila na casa de cambio (chamada de CADECA), pois já
haviam me dito que em Cuba, pra tudo tem fila. Bem, não foi bem assim
também....
Eu tinha lido que o país
possuía duas moedas: o CUP, usado pelos cubanos, e o CUC, usado somente pelos
turistas. Bem, não é mais assim também.... Na verdade o CUP continua sendo
usado somente pelos cubanos enquanto que o CUC, moeda forte, com cotação quase
equivalente ao Euro (1 Euro = 1,05 CUC), é a utilizada na realidade e circula
para tudo e entre todos. Sobra ao CUP (1 CUC = 25 CUP) ser pago aos
trabalhadores pelo governo e para ele retornar, através de contas de água, luz,
telefone, aluguel, mercados e lojas estatais.
Superada a surpresa inicial,
hora de caminhar até a atração mais ansiada por mim, o malecon. E aí sim! Ele é
tal e qual o descreve o “Trilogia”.
Apesar de ter vários prédios
públicos reformados e mais alguns sendo reformados, a beira mar de Havana parece que permanece a
mesma desde a época da Revolução. Quer dizer.... Nada novo foi construído mas os prédios antigos, da década de 50,
foram ganhando ao longo dos anos as marcas da deterioração do tempo e da
maresia do Caribe. Lá, estamos na Cuba da minha imaginação.
Depois de muita caminhada,
voltamos pra casa. Havana, para quem gosta de se perder caminhando pelas ruas é
uma maravilha! Cidade segura e fácil de se orientar, foi percorrida por nós à
pé ao máximo. A única ocasião que utilizamos táxi foi na ida/vinda pro
aeroporto e para o Hotel Meliá, onde precisei pegar o kit da corrida.
É bem verdade que para ter
uma visão mais abrangente da cidade, indo para bairros um pouco mais afastados,
pegamos no nosso segundo dia aqueles ônibus de dois andares que fazem tour
turístico (Habana Tour Bus). Valeu muito à pena, mas o bom mesmo foi caminhar,
caminhar, caminhar....
A Plaza Jose Martí é ponto
de partida para muitos dos pontos turísticos.
O Capitólio, antigo prédio
do Governo estava em reforma, portanto fechado. Vizinho a ele, o belíssimo
Teatro. A Catedral, a Plaza Vieja, a Plaza de La Revolucion, com os
emblemáticos rostos de Che Guevara e Camilo Cienfuegos, o famoso e imponente
Hotel Nacional (e outros hotéis antigos, lindíssimos no seu interior), o Paseo
del Prado que liga a Plaza Central ao Malecon, tudo devidamente visitado.
Mas nosso passeio preferido
foi caminhar pelas ruas da cidade, sem sombra de dúvida. Tanto que nem fomos ao
famoso Museu de La Revolucion. Não quisemos “perder” nosso tempo de observar a
cidade. Caminhar, passear pelo malecon,
pelo porto, observar os cubanos, parar num barzinho pra tomar mojito ouvindo
música, se deparar sem querer com uma academia de box e “curiar” o treino,
torcer o pescoço para todo carro antigo bonito que passava, dando a impressão
de termos sido transportados no tempo ou de estarmos em um museu do automóvel a
céu aberto.
Bares e restaurantes, existem diversos e pra todos os gostos e
bolsos (sim, os cubanos já têm permissão de ter seu próprio negócio). Claro que na zona mais turística eles são mais caros. Saindo um pouco
mais dessa zona, os preços caem, assim como as opções. Na zona turística
paga-se caro, mas o valor é recompensado pela boa qualidade dos músicos que na
grande maioria dos bares e restaurantes diverte os turistas com um bolero ou
uma salsa animada, sempre passando o cofrinho ao final para as “propinas”.
Havana foi e não foi o que
imaginei. Uma cidade pulsante. Parada no tempo e caminhando a toda hora pra um
futuro que não se sabe ao certo onde será. Uma cidade de barulhos, de risadas,
de música. Uma cidade cheia e ao mesmo tempo sem o efeito sufocante das grandes
cidades (ainda). Mutante. Velha e nova. Decadente e florescente. Pulsante.
Dicas pra quem vai:
Onde se hospedar: fiquei em
Centro Havana e ficaria novamente. Ou lá ou em Habana Vieja, onde se concentram
as atrações turísticas e você pode transitar livremente sem depender de carro.
Casa Particular ou hotel:
toda minha hospedagem em Cuba foi em casa particular. Achei que seria um modo
de ter contato com o povo local e realmente foi. Mas existem hotéis (embora
sejam bem mais caros). Ficamos na Casa Colonial Abogados Leonardo Y Angel,
pertencente a um casal de advogados, Ângela e Leonardo, muito simpáticos,
prestativos e garantia de uma boa conversa. Quartos limpos, espaçosos,
confortáveis, com ar condicionado e geladeira. Recomendo. Diária 30 CUC, sem
café da manhã, que custa 5 CUC em toda casa particular. Mas se quiser um café
padrão 5 estrelas, pague 6 CUC no Hotel Inglaterra, na Plaza Jose Martí). Contato da casa: leoangela2014@gmail.com
Saindo/Chegando do
aeroporto: na chegada vale contratar o transfer com o dono da sua casa
particular. Pagamos 30 CUC por isso. Do contrário, existem táxis normais. Na
volta, a dona da pousada providenciou pra nós, por 25 CUC, um carro se
desmanchando de velho. rsrs
Habana Tour Bus: tour
turístico muito bom, onde você pode descer e subir novamente nas atrações
principais. 10 CUC por pessoa
Bares: pesquisando pela
internet, existem inúmeras possibilidades. Dentre os mais populares estão o La
Bodeguita Del Medio e o La Floridita, ambos frequentados
pelo escritor Ernest Hemingway, que fez a fama dos locais.
O La Bodeguita é mínimo, com
espaço praticamente para o freguês pagar a maior atração da casa, o mojito (5
CUC, o mais caro da viagem). Vale a pena e tivemos a sorte de ter um grupo
musical maravilhoso no dia que fomos.
Preparando o Mojito
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=HD7ORu6YqDo
Animação no La Bodeguita
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=g4J8NwNVdq0
La Floridita é famoso por outro drink, o daiquiri. Bem que tentamos prová-lo, mas, apesar do bar ser um pouco maior que o outro, nas nossas três tentativas foi impossível, de tanta gente.
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=HD7ORu6YqDo
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=g4J8NwNVdq0
La Floridita é famoso por outro drink, o daiquiri. Bem que tentamos prová-lo, mas, apesar do bar ser um pouco maior que o outro, nas nossas três tentativas foi impossível, de tanta gente.
Fora esses, fomos também ao Los
Hermanos (vizinho ao Museo Del Ron) e no El Dandy (Brasil com
Plaza Del Cristo), todos em Habana Vieja.
Restaurantes:
Dentre os recomendados, o Dona
Eutímia me pareceu ser o campeão, mas tem que fazer reserva então não
fomos a ele.
A dona da nossa pousada nos
recomendou muito o Los Nardos, que fica em frente ao Capitolio, mas também não
tivemos tempo.
Comíamos quando sentíamos
fome e no que nos atraísse e, dentre eles, fomos atraídos por um em frente ao
Malecon somente pela vista que proporcionava e surpreendentemente tivemos a
melhor ropa vieja (prato típico de carne) de Cuba. O restaurante, El
Presidente, fica logo no começo da orla, tem uma vista belíssima,
atendimento atencioso e ainda por cima fomos brindados com um excelente
violonista que cantou Sílvio Rodrigues para nós.
Entrada do El Presidente |
Táxi: os táxis em Cuba não
têm taxímetro, então o negócio é negociar com antecedência. Como andamos
pouquíssimo, não tivemos problemas. Dentro de Havana as corridas variam entre 5
e 10 CUC.
Rum: bebe-se muuuuito em
Cuba e o rum é disparada a bebida campeã. O Havana Club (antigo rum Bacardi
antes da revolução) é visto e servido em todos os lugares, mas tem também o
Santiago de Cuba que me falaram ser até melhor que o Havana Club. Tanto em
lojas do governo quanto nas lojas para os turistas, como La Casa Del Habano, eles
têm o mesmo preço, de acordo com tempo de envelhecimento do rum.
Charuto: são diversas marcas
e tamanhos e, diferentes do rum, os charutos são mais caros. As marcas mais
conhecidas são Monte Cristo, Partagás e Cohiba (a preferida de Fidel Castro).
Mas atenção: também diferente do rum, que é seguro comprar, os charutos devem
ser SEMPRE comprados em lojas seguras, como La Casa Del Habano. Se
não quiser se arriscar em levar charutos falsificados, jamais comprar de
ninguém que ofereça na rua com conversa fiada e bastante atenção pra não cair
no golpe do charuto, bastante conhecido, mas que ainda faz suas vítimas, dentre
elas, quaaaaase que fizemos parte das estatísticas.
O golpe: estávamos
procurando o acesso de entrada para visitar o Hotel Nacional e perguntei a um
rapaz que estava parado num posto de gasolina por onde era esse aceso. Ele foi
muito gentil, logo perguntou de onde éramos e disse que sua mãe era médica do
programa Mais Médicos em São Paulo, e blá, blá, blá, muita conversa, nos
falando sobre Cuba, onde deveríamos comer, etc. Nos disse que o Hotel Nacional
estava temporariamente fechado para visitantes porque o Presidente do Japão (?)
estava reunido com Raul Castro naquele momento. Perguntou-nos onde estávamos
hospedados e nós dissemos o nome da rua. Perguntou-nos se gostávamos de
charutos e disse-nos que estávamos com bastante sorte pois justamente aquele
era o dia anual que Raul Castro, pra fazer um agrado aos trabalhadores de Cuba,
vendia charutos e rum pela metade do preço em umas cooperativas. Indicou-nos
então o caminho e nós, nem mesmo muito interessados, como estávamos só
passeando, decidimos ir ver.
Seguimos os dois sozinhos
pela rua indicada e logo mais à frente, no sentido contrário, veio um outro
rapaz que nos parou demonstrando surpresa e alegria “Oi, conheço vocês! Não
estão hospedados na rua Neptuno? Eu os vi por lá!” E começou a falar e também
mencionou a tal cooperativa de charutos, oferecendo-se para nos levar.
Foi nessa hora que
finalmente caiu a minha ficha! Eu tinha lido sobre esse golpe na internet!
Igualzinho! O primeiro homem pega o máximo de informações nossas, repassa tudo
por celular ao segundo, que vem como que por acaso e finge nos conhecer e por
vezes, até ser amigo do dono da pousada, para inspirar confiança e nos levar ao
local que vendem os charutos falsificados, feitos de folha de bananeira. Tudo
só na lábia.
Bem, dissemos que não
queríamos, demos meia volta e fomos visitar o Hotel Nacional, que não estava
interditado pra “presidente” do Japão coisa nenhuma!
Internet: para ter acesso,
você tem que comprar um cartão que lhe dá direito a 1 hora (2 CUC) ou a 5 horas
(10 CUC) nas lojas do governo, chamadas ETECSA, onde sempre tem muita fila.
Felizmente conseguimos o cartão de 1 hora em um quiosque perto do Paseo Del
Prado, com o ágio de 1 CUC e evitamos as filas, mas é preciso paciência pra
usar a internet em Cuba..... Primeiro,
não é em todo local que existe o acesso ao wifi. Somente nos saguões de
alguns hotéis (que o turista pode entrar à vontade para acessar) e em algumas
praças (que você identifica quando vir um monte de gente teclando em seus
celulares). Segundo, o sinal cai muito e você tem que recolocar pacientemente o
login e a senha do cartão.
Cartão para wifi : imagem bem apropriada |
Câmbio: nas CADECAS.
Filazinha básica sem problemas maiores. Mas não leve dólar. Sobre o dólar o
governo coloca ágio de 10% e não vale a pena. Leve euros pra trocar.
Veja também sobre Cuba: O que eu vi em Cuba em novembro de 2016
Cienfuegos
Trinidad
XXX MARABANA - Maratón de la Habana - Cuba (20/11/2016)
Veja também sobre Cuba: O que eu vi em Cuba em novembro de 2016
Cienfuegos
Trinidad
XXX MARABANA - Maratón de la Habana - Cuba (20/11/2016)
Mais fotos:
Fila na CADECA para trocar dinheiro |
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=IjUJC0YUYCU
Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=70OhSjvMeAA
Entardecer no Malecon |
Noiva chegando no Hotel Meliá |
Da nossa varanda |
Os apartamentos reformados são os que os proprietários alugam como "casa particular" |
Rua da "nossa" casa |
Surpresa de uma corrida antes da Marabana |
Gran Teatro de La Habana |
A cúpula do Capitólio e o Teatro |
O Hotel Nacional |
Partida de baseball, o esporte mais popular de Cuba |
Prédios de uma Havana "mais moderna" |
Praça da Revolução com o rosto de Camilo Cienfuegos |
e Che Guevara |
Malecon |
Catedral |
La Bodeguita Del Medio |
Brinde com mojito e cerveza Cristal |
Plaza Viejas |
Bairro Chinês |
Porto e duas épocas |
Avenida del Puerto |
Malecon |
Prato cubano: ropa vieja |
Turistas deixando a ilha |
Coco Taxi |
Retrato de Fidel no Hotel Nacional |
Interior do Hotel Inglaterra |
Paseo del Prado |
Mais um cantor nos bares de Havana: https://www.youtube.com/watch?v=uLL-VNIhEzc
2 comentários:
Texto maravilhoso e empolgante.
Fiquei com vontade de ir.
sonia Paraíba
Sou suspeito pra elogiar, mas vc foi mt feliz ao concluir que Havana é "Mutante. Velha e nova. Decadente e florescente. Pulsante." Nota mil, grande repórter!
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